domingo, maio 16, 2010

Séries de TV Estado-unidenses (uma lucrativa indústria desgovernada)

O primeiro post desse blog sobre séries de TV estava programado para acontecer em mais alguns dias, quando eu escreveria, logo após a exibição do último episódio de LOST, pela ABC, de como o mundo das atrações em vídeo mudou com essa série. Pretendo contar nesse texto, sobre a evolução e as revoluçoes desse tipo de mídia, sua inserção na sociedades do passado do presente e do futuro, da sua qualidade e importância artística. Falarei das grandes revoluções trazidas pela experiência de LOST.

Mas terei que falar antes disso e será nesse texto, ora sendo escrito, dessa indústria e de outros de seus produtos. Isso devido a uma notícia que surpreendido, eu recebi nessa última sexta-feira:

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Séries "Heroes" e "FlashForward" são canceladas nos EUA




Los Angeles (EUA.), 14 mai (EFE).- As redes de televisão "NBC" e "ABC" anunciaram hoje o cancelamento de duas de suas grandes apostas, as séries "Heroes" e "FlashForward", devido a uma perda de interesse entre os espectadores americanos, informaram meios de imprensa especializados.
As séries geraram muita expectativa quando apareceram na grade de programação, alcançando bons índices de audiência e o respaldo da crítica, mas mudanças internas nas equipes de produção e problemas de roteiro lhes trouxeram problemas de execução.
"Heroes" estreou em 2006 e se transformou em um acerto para a "NBC" tanto nos EUA como no exterior, até o ponto de chegar a ser comparada com a bem-sucedida "Lost" (ABC).
Segundo a revista "The Hollywood Reporter", a rede tinha previsto pôr fim à série em sua quarta temporada e fechar a trama com um último capítulo de várias horas.
No final, devido aos altos custos e aos pobres "ratings", a rede optou por não realizar este último episódio e acabar com "Heroes".
Menor percurso teve "FlashForward", uma série que estreou em 2009 aspirando ser a herdeira de "Lost" na "ABC", que decidiu finalmente suprimi-la de sua programação após uma temporada, publicou hoje a "Variety".
A "ABC", no entanto, deu sinal verde para a produção de novos capítulos do "remake" de "V", que atualmente está terminando sua primeira temporada nos EUA.
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Bem eu devo dizer, que pela própria experiência que a gente acumula, durante a vida, seria realmente muito difícil um mesmo canal de TV, emplacar duas séries históricas, uma começando logo no fim da outra. Mas essa possibilidade surgiu, quando surge o FlashForward.
Surgiu mas não prosperou, por decisões de mercado, que nessa atividade específica, nesse país onde essas produções estão concentradas, tem um poder desmedido sobre os destinos das iniciativas.
Não quero aqui ser um crítico, idiota, do capitalismo, que se não é um sistema perfeito, eu sei que é o mais viável dos já testados pela humanidade.
Mas quero criticar, sim, a falta de respeito com que o consumidor é tratado pelos financiadores dessas produções.
E digo dessas produções, e desses financiadores sim, porque considero sim, que neles reside esse erro, e não no sistema como um todo. Digo isso, porque aqui no Brasil, onde ao longo da história temos praticamente um único canal de televisão quase que monopolizando toda a produção de conteúdo para vídeo do país, mas que mesmo não tendo concorrentes em quase todos os momentos da história, não tem em seu histórico esse tipo de decisão acontecendo a todo momento como acontece na TV estado-unidense  com suas séries todos os anos.
Produzir conteúdo de longo prazo para TV, é sempre o risco, e fica sempre a mercê dos sabores e dissabores dos índices de audiência, e isso acontece em todo mundo. Mas índices de audiência mesmo que baixos, mas diferentes de zero, indicam é que há pessoas que gostam e que se interessam por aquele conteúdo. Cinco milhões de espectadores, pode ser pouco para a ABC dizer que a série seja lucrativa. Mas simplesmente cancelar a série no meio, sem dar aos bem mais de Cinco milhões de pessoas que acompanham a série pelo mundo todo um destino que pelo menos encerre de alguma forma o enredo da série, é dizer a essas pessoas todas que se fodam.
Aqui no Brasil, vira e mexe a Globo investe em alguma atração que não decola nos índices de audiência, e isso é normal. Mudança de elenco, de roteiristas, de diretores acontecem e as vezes resolvem, e as vezes não. Há histórias extremamente pitorescas, como uma novela em que o roteirista original foi se perdendo e se perdendo, e inchando elenco e a história não se desenvolvia, e inevitavelmente o reflexo aparecia na audiência. A Globo então escalou Janete Clair para assumir esse roteiro, ela chegou, inventou um terremoto, matou metade dos personagens e desenvolveu o resto da história de forma mais concisa e com relativo sucesso.
Essas coisas acontecem, e quando não resolvem, a Globo costuma apressar o final de uma novela, encurta o enredo, mas dá um final. Ninguém aqui no Brasil sequer imagina a situação de uma noite de quarta-feira sentar-se a frente da TV para assistir sua novela preferida e descobrir que ela não mais passará a partir daquele dia, por influencia dos baixos índices de audiência.

Eu sei que a história das novelas da Globo, e das série de TV dos canais estado-unidenses como a ABC são extremamente diversas. Que se as novelas sempre tiveram um enredo de longo prazo a ser trabalhado, as séries de estado-unidenses nasceram como pequenas histórias de determinados personagens, mas que fechavam seu enredo em cada capítulo. Só que hoje, pela própria evolução das mídias e do entretenimento no mundo todo, e num outro texto discutirei toda essa evolução, é praticamente inviável uma série sobreviver sem um enredo de longo prazo, porque é esse enredo de longo prazo que faz o espectador reservar um pedaço do seu tempo para ver a série. E não raro, como é o caso em FlashForward, os capítulos não se fecham em si (assim como em LOST) sendo o enredo de longo prazo a grande atração do produto.
Nesse cenário, o cancelamento de séries, sem o fechamento dos enredos, mesmo que justificados, pela baixa lucratividade e baixos índices de audiência, tornam-se um tiro no pé, na medida em que levam a uma perda de credibilidade da emissora que o transmite, junto aos espectadores que mesmo em minoria acompanhem o produto e esperem dele um desfecho para o enredo.
Esses espectadores, e entre eles me incluo, podem nem começar a assistir outras séries que venham a ser produzidas, ou melhor dizendo, impor mais dificuldades a reservar um espaço do seu tempo para acompanhar uma série pela crença historicamente comprovada de que a qualquer momento pode ser cancelada sem fornecer desfechos para os enredos abertos.
Me foquei mais nesse texto no FlashForward, primeiro porque nesse caso específico eu sou atingido como consumidor, mas não só por isso. Tendo o FlashForward a mesma emisora do LOST, que é a mais importante série de TV já realizada, e não é pelos índices de audiência na TV estado-unidense, onde ela não foi nunca destaque em comparação com outras produções, mas pela movimentação que ela produz pela internet, seja em consumode conteúdo, seja em discussões e fóruns, seja em geração e consumo de produtos interativos conectaods a série. E também economicamente, a ABC já observou em LOST, uma geração de lucro outra, que se dá pela venda de DVDs e outros produtos franqueados da série. A ABC teve então, recentemente, com LOST a experiência de que a importância, a lucratividade, o reconhecimento e o direcionamento de investimentos futuros que uma série de TV com conteúdo diferenciado, como LOST e FlashForward podem dar são retornos muito maiores do que simplesmente os ídices de audiência podem demonstrar.
FlashForward é uma série com um mote inicial sensacional, muito bem tratada em seu início. Com roteiro elenco e direção bem estruturados, cujo enredo me seduziu de cara. Há alguns momentos da série como no sétimo capítulo, em que o agente do FBI Al Gough se suicida, que estão entre os momentos mais fantásticos de atrações realizadas para a TV no ano passado. Mas todos esses momentos se perderão no tempo, como lágrimas na chuva.
Em relação o Heroes, nunca me passou pela cabeça reservar um pedaço do meu tempo para assistir, sempre achei que era uma confusão de conteúdos desconexos misturados e tratados de forma até amadora, mas ainda assim considero que o cancelamento é um desrespeito a quem acompanha e gosta da série, e eu me junto a eles em suas reclamações.
Já o "V", fico feliz que continue, eu gosto e acompanho... mas é somente um remake. E muito do eu gostar, vem de uma memória afetiva, do original, eu acredito. E repito aqui que é pena que produções originais e promissoras como FlashForward, não tenham o mesmo tratamento.

Por fim, digo que se a indústria do entretenimento pela TV nos Estados Unidos, não entender que no mundo de hoje o poder de decidir o que consumir está cada vez mais na mão dos consumidores, e que todos eles tem de ser tratados com respeito e carinho, principalmente porque inevitavelmente, cada vez mais as pessoas terão opções outras de entretenimento, então nesse caso, a própria indústria tenderá a extinguir-se, extinção que será acelerada pelas próprias decisões de mercado tomadas para se proteger de uma ou outra deficiência monetária. E sendo assim, ficaremos todos privados de que algum dia surja uma outra coisa que seja tão fantástica como o LOST foi.


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