segunda-feira, março 29, 2010

E as Palavras Onde Estão (por Armando Nogueira)

"E as palavras, eu que vivo delas, onde estão? Onde estão as palavras para contar a vocês e a mim mesmo que Tostão está morrendo asfixiado nos braços da multidão em transe? Parece um linchamento: Tostão deitado na grama, cem mãos a saqueá-lo. Levam-lhe a camisa levam-lhe os calções. Sei que é total a alucinação nos quatro cantos do estádio, mas só tenho olhos para a cena insólita: há muito que arrancaram as chuteiras de Tostão. Só falta, agora, alguém tomar-lhe a sunga azul, derradeira peça sobre o corpo de um semi-deus.

Mas, felizmente, a cautela e o sangue-frio vencem sempre: venceram, com o Brasil, o Mundial de 70, e venceram, também, na hora em que o desvario pretendia deixar Tostão completamente nu aos olhos de cem mil espectadores e de setecentos milhões de telespectadores do mundo inteiro.

E lá se vai Tostão, correndo pelo campo afora, coberto de glórias, coberto de lágrimas, atropelado por uma pequena multidão. Essa gente, que está ali por amor, vai acabar sufocando Tostão. Se a polícia não entra em campo para protegê-lo, coitado dele. Coitado, também, de Pelé, pendurado em mil pescoços e com um sombrero imenso, nu da cintura para cima, carregado por todos os lados ao sabor da paixão coletiva.

O campo do Azteca, nesse momento, é um manicômio: mexicanos e brasileiros, com bandeiras enormes, engalfinham-se num estranho esbanjamento de alegria.

Agora, quase não posso ver o campo lá embaixo: chove papel colorido em todo o estádio. Esse estádio que foi feito para uma festa de final: sua arquitetura põe o povo dentro do campo, criando um clima de intimidade que o futebol, aqui, no Azteca, toma emprestado à corrida de touros.

Cantemos, amigos, a fiesta brava, cantemos agora, mesmo em lágrimas, os derradeiros instantes do mais bonito Mundial que meus olhos jamais sonharam ver. Pela correção dos atletas, que jogaram trinta e duas partidas, sem uma só expulsão. Pelo respeito com que cerca de trezentos profissionais de futebol se enfrentaram, músculo a músculo, coração a coração, trocando camisas, trocando consolo, trocando destinos que hão de se encontrar, novamente, em Munique 74.

Choremos a alegria de uma campanha admirável em que o Brasil fez futebol de fantasia, fazendo amigos. Fazendo irmãos em todos os continentes.

Orgulha-me ver que o futebol, nossa vida, é o mais vibrante universo de paz que o homem é capaz de iluminar com uma bola, seu brinquedo fascinante. Trinta e duas batalhas, nenhuma baixa. Dezesseis países em luta ardente, durante vinte e um dias — ninguém morreu. Não há bandeiras de luto no mastro dos heróis do futebol.

Por isso, recebam, amanhã, os heróis do Mundial de 70 com a ternura que acolhe em casa os meninos que voltam do pátio, onde brincavam. Perdoem-me o arrebatamento que me faz sonegar-lhes a análise fria do jogo. Mas final é assim mesmo: as táticas cedem vez aos rasgos do coração. Tenho uma vida profissional cheia de finais e, em nenhuma delas, falou-se de estratégias. Final é sublimação, final é pirâmide humana atrás do gol a delirar com a cabeçada de Pelé, com o chute de Gérson e com o gesto bravo de Jairzinho, levando nas pernas a bola do terceiro gol. Final é antes do jogo, depois do jogo — nunca durante o jogo.

Que humanidade, senão a do esporte, seria capaz de construir, sobre a abstração de um gol, a cerimônia a que assisto, neste instante, querendo chorar, querendo gritar? Os campeões mundiais em volta olímpica, a beijar a tacinha, filha adotiva de todos nós, brasileiros? Ternamente, o capitão Carlos Alberto cola o corpinho dela no seu rosto fatigado: conquistou-a para sempre, conquistou-a por ti, adorável peladeiro do Aterro do Flamengo. A tacinha, agora, é tua, amiguinho, que mataste tantas aulas de junho para baixar, em espírito, no Jalisco de Guadalajara.

Sorve nela, amiguinho, a glória de Pelé, que tem a fragrância da nossa infância.

A taça de ouro é eternamente tua, amiguinho.

Até que os deuses do futebol inventem outra".

Armando Nogueira - O anjo das pernas tortas

"Driblar, tendo pernas tão tortas - e driblar como ninguém - eis um mistério de Garrincha que eu não ouso explicar; Driblar, tendo uma perna mais curta que a outra - e driblar como ninguém - eis um mistério de Garrincha que tu não ousas explicar; Driblar, tendo um desvio na espinha dorsal - e driblar como ninguém - eis um mistério de Garrincha que ele não ousa explicar... Driblar, quase sempre para o mesmo lado, repetindo o gesto mil vezes para mil vezes afirmar-se negando o próprio conceito de drible - eis um mistério que não ousais explicar... Driblar - e driblar com tanta graça e naturalidade - eis um mistério de Garrincha que só Deus pode explicar.

Armando Nogueira - Nilton Santos

"Tu, em campo,
parecia tantos,
E, no entanto,
que encanto!
Eras um só;
Nílton Santos."

Armando Nogueira - Tostão e Dirceu Lopes

"O time do Cruzeiro deu alegria ao carioca em férias: Maracanã fechado, ficamos todos em casa vendo o maravilhoso futebol do tricampeão mineiro. Como é fluente, como é cristalino o estilo do Cruzeiro, a equipe segundo a observação de Paulo Mendes Campos, mais equilibrada emocionalmente "neste Pais de psicologia tão tumultuada".

Perfeito, poeta: o time do Cruzeiro, que reflete a espontaneidade de Tostão e Dirceu Lopes, é impertubável na sua determinação de jogar futebol: não faz cera, não da, nem troca pontapés e sabe exibir sua superioridade sem esnobações, sem olés debochativos.

Como não sou egoísta - pelo menos em materia de futebol - estou certo de que os mineiros do Cruzeiro, do Mineirão ou da Academia Mineira de Letras estão documentados em filmes da carreira brilhante e histórica do time do Cruzeiro.

Façam isso, sim, senão, amanha ou depois, a gente vai contar a quem não pode ver e é capaz de passar por mentiroso.

Não tenho dúvida em dizer que tardará muito até que apareça alguém que domine como Zico o dom de cobrar falta ali da meia-lua".

Armando Nogueira - A última noite (despedida de Zico)

"Celebremos, querido torcedor, a última noite do maior artilheiro da história do Maracanã. Será uma despedida de apertar o coração. Se te der vontade de chorar, chora. Chora sem procurar esconder a pureza da tua emoção. Basta uma lágrima de amor para imortalizar o futebol de um supercraque.

Cantemos, Maracanã, teu filho ilustre, relembrando em comunhão os dribles mais vistosos, os passes mais ditosos, os gols mais luminosos desse fidalgo dos estádios que tem uma vida cheia de multidões.

Louvemos o poeta Zico que jogava futebol como se a bola fosse uma rosa entreaberta a seus pés".





Comentário meu:


As palavras... elas estão onde sempre estiveram... junto com o mestre, mestre que nos ensinou um pouco como usá-las.  Agradecido para sempre ao Armando, que escrevendo sobre os esportes, que eu adorava, me despertou o amor pela escrita. Parte importante de que eu sou despertou para existência lendo as crônicas do Armando Nogueira. No fim só digo obrigado.











LÁ VAI ARMANDO, NO SEU AVIÃOZINHO INVISÍVEL

por Alberto Helena Jr em seu blog

A última vez que nos vimos foi pouco antes de o traiçoeiro mal o atingir, num Bem, Amigos em que o convidado especial era Nílton Santos, o Espírito Santo no altar da Santíssima Trindade de seu coração apaixonadamente botafoguense – os outros dois, Heleno de Freitas e Garrincha, embora esticasse um olhar cúmplice para Didi, o Folha Seca.
Nessa noite, no restaurante do Lellis, entre tantas rememorações, cometi a indelicadeza involuntária de perguntar à Enciclopédia do Futebol sobre Stanley Matthews, aquele velhinho genial que lhe dera um baile memorável em pleno estádio de Wembley, numa excursão brasileira longínqua.
O mestre Armando Nogueira interveio, com a elegância de sempre:
- As amargas, não, Helena…
Alusão clara ao livro de memórias de Álvaro Moreyra, o Alvinho, pai do inesquecível cronista esportivo Sandro Moreyra, em que o autor, de cara, abriu mão dos episódios amargos por ele vividos ou testemunhados.
Assim era Armando, enfim, o homem, o cronista e o poeta que sempre preferiu explorar o lado lúdico da vida aos sombrios descaminhos da alma humana.
Mestre de todos nós – o Pelé dos cronistas esportivos brasileiros, já que em seus textos conjugava elegância ímpar, rigor extremo disfarçado de coloquial simplicidade, e uma cadência tisnada de discreta malícia que muitos interpretavam apenas como fina ironia.
Por isso, seus admiradores mais letrados o aproximavam de Machado de Assis, o que, cá entre nós, lhe causava certo incômodo. Não por desprezar o Bruxo, que muito o influenciou, claro, como a todos nós. Mas, porque outros autores lhe falaram ao coração, como Chesterton, por exemplo.
E, como um Saint Exupéry caboclo, deliciava-se em buscar nas nuvens, a bordo de seu ultra-leve, inspiração para a sua poética, em prosa ou verso, pois o mestre batia nas duas com igual categoria.
Podia passar o dia aqui falando de suas proezas jornalísticas, como a de ter sido testemunha ocular do Crime da Rua Toneleros, estopim para o suicídio de Getúlio Vargas, ou a foto histórica que tirou por instinto ao flagrar o técnico Zezé Moreyra desferindo um golpe de chuteiras na cabeça do ministro dos Esportes e treinador da mágica Seleção Húngara de 54, Gustav Sebes, ou mesmo de seu engenho em construir o jornalismo da Globo que revolucionou o telejornalismo brasileiro.
Assim como relatar nossos sempre amáveis encontros, embora tão esparsos ao longo dos últimos quarenta anos.
Mas, prefiro abreviar esse último aceno ao mestre, bem ao seu estilo, sem o mesmo talento. Pois, lá vai Armando, no seu aviãozinho invisível, garimpar uma nuvem branca, com listras pretas, sua morada eterna, de onde ficará nos espiando com aquele sorriso contido na alma e nos textos imortais.




O Poeta






Raramente é bom sinal receber uma ligação logo cedo. Foi o que aconteceu hoje e infelizmente, mais uma vez, a suspeita se confirmou; morreu Armando Nogueira.
Tenho a certeza de que os jornais, TVs, sites vão contar a história desse jornalista em detalhes, o que me deixa à vontade para concentrar no impacto que Armando teve em mim.
Armando me fez uma pessoa melhor, o que assumo ser a melhor influencia que um ser humano pode ter no outro. Armando me apresentou um jeito de ser que me fez repensar o meu jeito de ser.
Como já disse, à parte de ser um dos jornalistas mais influentes do país, Armando foi um poeta completo, pois foi poeta na sua profissão, na maneira de escrever e pautar os assuntos que cobria; mas, ainda mais importante e humano, foi um poeta na vida cotidiana, no lidar com as pessoas. E foi aí que ele me cativou de uma maneira doce permanente, definitiva.
Acompanhamos juntos Roland Garros inúmeras vezes, já que nos últimos anos Armando se apaixonou pelo tênis, um esporte que praticava de uma maneira que, digamos, não o deixava exatamente orgulhoso. Orgulho que sentia como tantos de nós em acompanhar Gustavo Kuerten no seu palco principal.
Em Paris, estávamos juntos todos os dias. Ele ficava sempre no mesmo hotel, o Chateau Frontenac, onde era tratado com carinho e reverencia, a poucas quadras do meu, e fez questão de me apresentar alguns dos melhores e mais charmosos restaurantes da cidade. Era um apaixonado pela boa cozinha e por um bom vinho tinto quando não uma champagne.
Ia Paris como turista do tênis e não como jornalista, apesar de que não deixava sê-lo em nenhum momento ou lugar. Costumava ir à mesa onde eu trabalhava na Quadra Philippe Chatrier e esperar que terminasse meu trabalho para acompanhá-lo in loco a algum jogo.
Com uma candura única, me sugeria uma pauta por uma perspectiva que tanto matava a charada e resolvia minha coluna diária, como me fazia realizar que, por maior fosse a minha boa vontade, o escrever para mim era uma aventura sem o charme, o talento e a visão do gênio. Algo como se Roger Federer viesse ao meu treino e me desse alguma dica na esperança de que aquilo que para ele é uma naturalidade o passasse a ser para mim. Eu interrompia o teclar, olhava na sua direção, ali de pé ao meu lado, quase suplicava por um pouco mais de tempo. Ele, que fora o diretor do Jornal Nacional por tanto tempo, um parâmetro na profissão, com sua humildade me atendia enquanto investia seu tempo em encantar outros profissionais por perto. Mal sabia ele que eu odiava perder qualquer minuto da sua companhia.
Poderia contar inúmeras estórias do Armando; do Armando comigo, do Armando com outros, histórias que ele me contou. Histórias interessantes são o que não faltavam quando ele estava por perto. O homem era capaz de transformar o mais mero fato em algo fascinante.
Ele me concedeu o privilégio de escrever a introdução do meu livro sobre Roland Garros e Gustavo Kuerten. No entanto, como já escrevi, o verdadeiro legado do Armando na minha vida, como tenho a certeza de que na vida das pessoas que com ele conviveram, foi nos mostrar que ser uma pessoa agradável, educada, generosa, era infinitamente mais fascinante e importante do que ser um erudito, uma enciclopédia ambulante, uma referencia na profissão, uma lenda em vida. O poeta da do cotidiano era ainda mais fascinante do que o poeta da escrita.
À parte de tudo que se pode escrever sobre suas conquistas profissionais, Armando Nogueira foi um lorde, um gentleman, um ser humano dos bons, dos que sentimos falta. Eu poderia escrever muito mais sobre ele, mas a internet clama pela destreza, pelo em cima da hora e, além do mais, eu não consigo parar de chorar.
Armando Nogueira nas portas de Roland Garros.



O futebol de Armando Nogueira

Por ROBERTO VIEIRA via blog do Juca Kfouri

Os três maiores cronistas do futebol brasileiro.
Agora batem bola na eternidade.
Primeiro se foi nosso Friedenreich:
Mário Filho.
Palavras e toques exatos, milimétricos.
Inventor do futebol fora das quatro linhas.
Depois partiu seu irmão, Nelson Rodrigues.
Garrincha de frases cortantes e desconcertantes.
Sempre driblando pela direita.
Até que a realidade mostrou-se surda.
Hoje se foi Armando Nogueira.
O menino de Xapuri.
Terra da borracha, da riqueza e da miséria.
Terra onde o menino corria atrás de uma bola.
Nos campinhos na beira do rio.
Armando que foi a síntese da poesia no futebol.
Armando que se deslumbrou com Heleno de Freitas.
Armando que fazia da pauta, latifúndio.
Armando que tal e qual Nilton era muitos sendo um só.
O futebol é jogado com os pés e feito de gols.
Mas se o futebol tem alma.
A alma do futebol está na sua poesia.
Poesia que brota das letras de quem ama o futebol-sonho.
Hoje a poesia do futebol está em silêncio.
E vai permanecer assim por algum tempo.
Pegando carona no também lendário Drummond.
Difícil não é escrever mil poesias como o Armando.
Difícil é escrever uma só poesia como Mestre Armando Nogueira.



Mestre Armando

por Juca Kfouri em seu Blog
Amanhã você lerá nos jornais quase todas as façanhas de Armando Nogueira.
Resumidamente, é claro, porque daria para fazer uma edição inteira só com elas.
Mas nunca mais você terá o privilégio de poder abrir um jornal e ler que “Ademir da Guia tem nome, sobrenome e futebol de craque”.
Ou que “Deus castiga quem o craque fustiga”.
Ou que  ” Se Pelé não tivesse nascido gente teria nascido bola”.
Nunca mais.
Mestre Armando dizia também que “o bom jogador vê a jogada, o craque antevê”, e ele, como craque que era, antevia não só a jogada, como a notícia.
Se há apenas uma palavra da língua portuguesa para defini-lo esta é, sem dúvida, delicadeza.
Língua cultivada e cultuada  por este apaixonado pelo Botafogo, pelo Acre e por voar de ultra-leve,  coisa para qual  se dedicou até a semana anterior da descoberta, três anos atrás, da doença que o levou.
Uma excelência entrou no Paraíso.



Dor

por Juca Kfouri em seu blog
Armando Nogueira morreu.
A última vez em que conseguimos nos comunicar, porque por telefone era sempre uma choradeira, foi por meio de uma mensagem que ele me mandou, em 10 de dezembro de 2008, exatamente às 10h38, para agradecer uma referência qualquer feita por mim num programa de TV:
“Juca Kfouri,
Teu carinho me conforta como o abraço de um irmão caçula.
Beijos do Armando”
Fico aqui com minha dor, incapaz de ser minimamente objetivo.
Tenho por ele infinito carinho mesmo e sei o quanto ele penou para dirigir o jornal mais visto no país no período da ditadura.
Leal, ele agiu sempre no limite da dignidade possível.
E tratou de proteger o quanto pôde aqueles que eram perseguidos.
O Brasil perde um belo jornalista, mas, antes de tudo, um homem de bem, um enorme ser humano.


A Biografia de Armando Nogueira


Comentarista esportivo morreu na manhã desta segunda-feira aos 83 anos


!
O jornalista Armando Nogueira, 83 anos, morreu na manhã desta segunda-feira após três anos sofrendo com um câncer. Comentarista esportivo, Armando foi colunista do Diário LANCE! e cobriu, presencialmente, todas as Copas do Mundo desde 1958.

Confira alguns fatos da vida e da carreira de Armando Nogueira:
1927: Armando Nogueira nasceu no dia 14 de janeiro, em Xapuri, no Acre, filho de Rodovaldo e Maria Soares.
1944: Chegou ao Rio de Janeiro, onde logo começou a trabalhar. Antes de concluir o curso de Direito, foi empacotador e revisor do Diário Oficial do Governo do Acre. No entanto, desde já sonhava ser jornalista.
1950: Começou a carreira de jornalista no “Diário Carioca”, pelo qual trabalhou como repórter, redator e colunista.
1954:Foi testemunha ocular do atentado ao também jornalista e político Carlos Lacerda. No dia seguinte, Armando fez história no jornalismo brasileiro ao assinar um artigo escrito em primeira pessoa com seu relato do fato – algo nunca feito antes.
No mesmo ano, cobriu sua primeira Copa do Mundo, na Suíça. Lá, flagrou uma briga entre o técnico da Seleção, Zezé Moreira, e o ministro de Esportes da Hungria. Deste então, participou da cobertura dos 13 Mundiais seguintes.
1957: Após passagem pela revista "Manchete", trabalhou como repórter-fotográfico da revista "O Cruzeiro". Lá ficou por dois anos, transferindo-se depois para o "Jornal do Brasil", pelo qual foi redator e colunista.
1966: Foi para a Rede Globo, tendo papel fundamental no desenvolvimento do telejornalismo da emissora e do Brasil.
1980: Participou pela primeira vez da cobertura de uma Olimpíada, em Moscou. Voltou aos Jogos outra seis vezes. Sua única ausência deste então aconteceu em 2008, em Pequim, por problemas de saúde.
1990: Deixou a Rede Globo após 26 anos. Após sair da emissora, passou a se dedicar exclusivamente ao esporte.
2008: Recebeu a medalha de Honra da Ordem ao Mérito de Comunicações das mãos do ministro Hélio Costa. Armando foi homenageado pelos 60 anos de serviços prestados ao jornalismo brasileiro.
Bibliografia:
Ao longo da carreira, Armando Nogueira escreveu dez livros, todos eles sobre esporte. Confira a bibliografia do jornalista:
1) Drama e Glória dos Bicampeões
2) Na Grande Área
3) Bola na Rede
4) O Homem e a Bola
5) Bola de Cristal
6) O Voo das Gazelas
7) A Copa que Ninguém Viu e a que Não Queremos Lembrar
8) O Canto dos Meus Amores
9) A Chama que não se Apaga
10) A Ginga e o Jogo




A Repercussão do passamento de Armando Nogueira no meio jornalistico



Na manhã desta segunda-feira (29), o Brasil perdeu uma de suas grandes referências no Jornalismo. O jornalista e cronista esportivo Armando Nogueira (83) morreu vítima de um câncer no cérebro.

Um dos criadores do "Jornal Nacional" e "Globo Repórter" e dono de um texto que fugia da obviedade do jornalismo esportivo, Nogueira foi, por 25 anos, diretor de Jornalismo da TV Globo. Escreveu dez livros e esteve em todas as Copas do Mundo desde 1954, seja como fotógrafo, repórter ou comentarista. 

O corpo de Armando Nogueira é velado no Maracanã, no Rio de Janeiro (RJ), e o sepultamento acontece na próxima terça (30), ao meio-dia, no cemitério São João Batista, em Botafogo.

Abaixo, leia os comentários de alguns jornalistas sobre a morte de Nogueira. 






Divulgação
Juca Kfouri

Juca Kfouri (ao Portal IMPRENSA)

"Olha, para mim é difícil ser, digamos, objetivo em relação a ele. Tenho um profundo carinho por ele, acho que o Armando pagou um preço alto por ser um pragmático por dirigir o principal jornal do Brasil durante um tempo duro na ditadura e isso fez com que tivesse muita incompreensão contra ele. 

Ele zelou fielmente pela empresa em que trabalhou, ao mesmo tempo, em que tratou de proteger pessoas que eram perseguidas pela ditadura. 

Morre um jornalista talentosíssimo e um grande cidadão brasileiro".

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Fernando Mitre (ao Portal IMPRENSA)

"O Armando Nogueira era um jornalista brilhante sobre todos os pontos de vista, a começar por um texto de altíssimo nível. A presença dele irradiava a redação. 

Era um grande amigo, grande companheiro, muito criativo no comando de redação. Dirigiu o Jornalismo da Globo em um momento muito difícil e se comportava com muita dignidade".

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Milton Neves (em seu blog)

"O Brasil amanheceu mais triste hoje.

Perdemos nosso querido e respeitadíssimo Armando Nogueira.
Poeta na alma e jornalista no coração, o bom Armando lutava contra um câncer desde 2007. Luta em vão contra essa maldita doença, mas que nos brindou com alguns anos a mais de sua agradável companhia.

Diretor da 'Central Globo de Jornalismo' de 1966 a 90, Armando foi o criador do 'Jornal Nacional' e do 'Globo Repórter', até hoje sucessos na grade da TV Globo.

Foi dele também a histórica narração em primeira pessoa do famoso episódio da Rua Toneleiros, em Copacabana (RJ), quando testemunhou o atentado contra o jornalista Carlos Lacerda. No dia seguinte, o incidente foi detalhado por Armando no 'Diário Carioca'. 

Também de sua autoria foi a célebre frase sobre o Anjo de Pernas Tortas, de Vinicius de Moraes. "Para Garrincha, a superfície de um lenço era um latifúndio", dizia o grande Armando.

Um jornalista com formação em direito.

Um poeta, no coração e na alma.

Fique com Deus, Mestre Armando Nogueira!"

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William Bonner ---- (ao G1)

"Pessoalmente, foi sob sua gestão que eu surgi na Globo, em 1986, e foi pelas mãos dele que eu vim pro Rio, em 1989, onde vivo até hoje e construí minha família"

Ele me abriu as portas da TV Globo e me ensinou a fazer telejornalismo. Se tenho algum nome hoje nesse mercado foi porque ele me ajudou a construir", sintetizou. "Ele foi um artista da crônica esportista, com um texto que era, sem exageros, um diamante.
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Glenda Kozlowski

"Armando Nogueira! Querido! O céu ganha mais uma estrela! Um gênio se foi... Sorte nossa que as suas palavras são eternas"

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Pedro Bial (à Globo News)

"Estou emocionado porque é como perder um pai. Armando Nogueira é prova atuante de que você pode fazer jornalismo de qualidade e também usar a língua portuguesa com seus melhores recursos e as mais belas palavras".



Boninho, diretor do BBB 10 - "Deixo meu beijo para o jornalista, amigo, aviador, poeta e criador do JN, Armando Nogueira. Nosso Manduca acaba de falecer no Rio de Janeiro!", escreveu em seu Twitter.
Boni, ex-diretor da TV Globo, em entrevista à Globonews - "Ele foi uma figura muito importante na época da ditadura. Foi um baluarte na defesa da liberdade, com sua capacidade de diálogo. Vamos creditar isso à luta da liberdade de expressão", afirmou. "Ele era uma pessoa polivalente. A poesia estava presente em tudo na sua vida. Era uma pessoa realmente maravilhosa", completou.
Galvão Bueno, apresentador esportivo - "O comandante decolou". "Ele tinha paixão por ultraleves. Sempre foi nosso mestre. Quando chegar nossa vez, o caminho estará pronto, ele nos dará todas as instruções. Aprendi demais nessa amizade fraterna durante os últimos 30 anos", disse.
Renata Capucci, jornalista - "Mestre Armando Nogueira morreu", escreveu ela em seu microblog.




Amor Pela Palavra – entrevista com Armando Nogueira

Publicado na revista MONET – Edição 5/Agosto fe 2003
Armando Nogueira 2
por humberto peron
Nenhum jornalista esportivo escreve um texto como Armando Nogueira. Ao mesmo tempo em que é capaz de fazer poesia ao destacar o romantismo e a beleza do esporte, ele consegue compor textos acessíveis aos seus leitores. “Quando me perguntam qual é o meu melhor texto, eu digo que é o próximo. Porque a gente nunca está satisfeito com o que escreve”, afirma humildemente.
Além da excelência de seus artigos, Armando, aos 76 anos, é um sinônimo de credibilidade. O garoto que chegou ao Rio de Janeiro, em 1944, vindo da pequena Xapuri, no Acre, com o sonho de ser aviador, logo se apaixonou pelo futebol. Formado em Direito, começou a carreira no “Diário Carioca“, seis anos depois. No seu extenso currículo, há passagens pelo “Diário da Noite“, “Tribuna da Imprensa“, “Jornal do Brasil”, “TV Rio“, revistas “O Cruzeiro” e “Manchete“. Isso sem falar da marca de ter estado presente cobrindo todas as Copas do Mundo desde 1950.
Porém, o principal marco de sua trajetória foi quando exerceu a função de diretor de jornalismo da Rede Globo por 24 anos. Atualmente, ele escreve uma coluna esportiva em 60 jornais do Brasil, comanda o programa “Papo com Armando Nogueira” , no Sportv, e participa como comentarista dos principais eventos transmitidos pelo canal.
Prestes a lançar seu décimo livro, “A Ginga e o Jogo“, Armando concedeu esta entrevista na qual fala de sua relação com o esporte e a palavra, sobre o momento atual do futebol, dá sua opinião sobre os Jogos Pan-Americanos e revela qual manchete gostaria de dar um dia.

O senhor nasceu em Xapuri. O que o fez sair do norte do País para chegar ao Rio de Janeiro? 

Eu cheguei ao Rio de Janeiro em 1944 com um projeto de vida que não tinha nada a ver com o jornalismo. Embora eu tivesse trabalhado como revisor lá no Acre, o meu plano de vida era ser aviador. Era meu ideal, que acabou frustrado por várias razões. Então, eu fui fazer o curso de direito. Mas já no segundo ano, fui atraído pelo jornalismo. Entrei num jornal chamado “Diário Carioca”, um diário de elite. Naquela época, o Rio de Janeiro era uma cidade fascinante, não tinha narcotráfico nem corrupção. Também não tinha especulação imobiliária. Era uma cidade maravilhosa. Era a coisa mais fácil chegar ao Rio de Janeiro e não sair mais daqui. Eu sei de muitas pessoas que vieram ao Rio de Janeiro, no passado, para ficar alguns dias e ficaram décadas. Foi o que aconteceu comigo.
Qual o segredo para escrever um texto literário e popular ao mesmo tempo?
A chave da questão é o amor à palavra. Desde garoto eu tenho verdadeira veneração pela palavra. Comecei a ficar encantado pela palavra falada porque havia um poeta chamado Juvenal Antunes, que ficava declamando poemas nas ruas da minha cidade, e aquilo ressoava nos meus ouvidos como uma música. Então, aquela sonoridade, aquela musicalidade da palavra foi me cativando e desde cedo a gente aprende que o que entra pelos ouvidos vai direto ao coração. O fato de escrever um texto elaborado tem muito a ver com o exercício associado da imagem. Minha carreira sempre foi muito ligada à imagem. Minha sensibilidade ficou dividida entre a imagem e o texto. É como se eu fotografasse ou filmasse o fato que estou narrando. Quando me perguntam qual é o meu melhor texto, eu digo que é próximo, porque a gente nunca está satisfeito com o que escreve. Na verdade, tem sempre o que melhorar num texto.
Ainda existe poesia no futebol?
Existe poesia em tudo. Numa pedra, num pôr-do-sol, num ombro de uma mulher. Há, no futebol, ou em qualquer outra modalidade esportiva, quando você se surpreende com a coincidência entre o momento estético que você está contemplando e sua própria alma. O ser humano busca a beleza e a perfeição, e o gesto esportivo tem muito a ver com a busca da perfeição da estética. Todo gesto esportivo tem esse sabor lúdico.
Qual a sua opinião sobre a atuação da crônica esportiva no País? 
O jornalismo no Brasil passou por diversos períodos de obscuridade. Atravessou vários períodos de ditadura e censura. Mas essa censura nunca chegou às páginas esportivas. Então o jornalismo esportivo é naturalmente um libertário. São poucos os jornalistas esportivos que têm espaço para opinar, a grande maioria dos jornalistas só informa. Você conta nos dedos os que têm esta prerrogativa de emitir opinião, de tentar contribuir pra moralizar e melhorar o futebol.
Uma crítica ou elogio de jornalista pode influenciar a carreira de um jogador?
Eu acho que a crítica exerce um poder muito maior que nós imaginamos. Na verdade, a nossa opinião e julgamento sensibilizam 90% dos jogadores. Agora, esse peso não funciona para as raposas da política esportiva, elas ignoram a gente.
“Se o Pelé não tivesse nascido homem, teria nascido uma bola.” Essa é uma das suas mais famosas citações. Atualmente, existe algum jogador que poderia receber esse tipo de elogio?
Hoje há jogadores que realmente me encantam muito. O toque de bola do Zidane [Real Madrid], por exemplo. Me encanta muito a absoluta delicadeza com que ele faz um passe, toca na bola. Até parece que, comparada com a bola dele, a dos outros tem arestas. A dele não, é absolutamente redonda, parece que não tem costuras. Eu poderia citar o Romário [Fluminense], que é um jogador extraordinário, e oAlex [Cruzeiro]. Eles têm um toque de bola que é absolutamente mágico. Costumo dizer que há certos jogadores que têm a facilidade de tocar a bola de tal maneira que você não sabe onde termina o pé e onde começa a bola.
O senhor nunca negou sua paixão pelo Botafogo…
Não, apaixonado não. Porque se você entra numa profissão como a minha, tem como regra sagrada a busca da eqüidistância e da imparcialidade. Isso é um princípio ético que o jornalista tem de respeitar. De tanto você ser cobrado eticamente ao ir para o computador, há uma cobrança muito grande da sua consciência. Não posso dizer que eu sou um apaixonado, diria que eu sou um apaixonado reprimido. O jornalista tem de ser um reprimido para conquistar credibilidade. Não acredito que, se eu fosse um escrachado torcedor do Botafogo, tivesse o número leitores que tenho, sobretudo merecesse o respeito deles.
Qual a diferença entre o futebol jogado atualmente e o do passado?
Ele não é nem melhor nem pior, é diferente. Mas continua muito interessante. O jogo teve uma fase de absoluta esterilidade por uns 30, 40 anos, quando predominava a retranca. Fiquei muito assustado quando vi agora a mídia brasileira exaltando o time do Boca Juniors, que derrotou o Santos na final da Libertadores. Aquele time não exprime o futebol argentino nem o futebol moderno. O futebol moderno é ofensivo. A quantidade de gols que acontece no futebol hoje, entre tempo regulamentar e prorrogação dada pelo árbitro, é infinitamente maior do que a gente pensa. Isso acontece porque os times estão jogando ofensivamente. Isso é inegável.
Armando Nogueira 1Seus textos, até algum tempo atrás, eram exclusivamente sobre futebol. Ultimamente, o senhor está escrevendo sobre os outros esportes. O que motivou essa mudança?
Foi o advento da televisão. Antes da TV eu tinha um olhar muito fechado, porque ia para o estádio ver futebol e não havia exposição de outros esportes. Aí, de repente, eu descobri encantos no tênis, no vôlei e no basquete. Antes, eu só ia a Copas do Mundo, e, de repente, comecei a ir a Jogos Olímpicos, o que também ampliou muito meu horizonte. Além disso, quando voltei a escrever em 1990, senti que precisava botar um olho na aldeia global e que eu não podia ficar só no futebol.
O que o público pode esperar da delegação brasileira nos jogos Pan-Americanos?
Eu acho que é sempre bom uma competição. Só que essas no nível pan-americano são absolutamente ilusórias. No último Pan, o Brasil trouxe 101 medalhas e deu a impressão de que nós éramos uma potência olímpica emergente. Na verdade, a gente tinha ganho medalhas folheadas a ouro, o que é diferente. Medalhas de ouro são nas Olimpíadas mesmo. Eu espero que os jogos de Santo Domingo não provoquem a mesma sensação ilusória que nos provocou o Pan de Winnipeg em 1999.
Seria possível apontar algum esporte ou atleta que deve ser destaque no Pan?
Nos esportes coletivos, para variar. O Brasil sempre terá chance no vôlei, basquete e futebol. São esportes nos quais a gente sempre se dá bem. Nos individuais, temos algumas esperanças, como a Maurren Maggi [salto em distância].
O senhor está lançando mais um livro. Sobre o que se trata?
O nome é “A Ginga e o Jogo” [Editora Objetiva]. É uma obra predominantemente de crônicas esportivas, mas tem também crônicas e perfis sobre pessoas não necessariamente ligadas ao esporte.
No início da entrevista, o senhor falou sobre sua paixão pela aviação. Como ela surgiu? E suas atividades no clube de ultraleves?
Essa paixão é anterior à do esporte. É muito mais antiga, uma paixão primordial dentro da minha vida. Com cinco, seis anos de idade eu já sonhava que estava voando montado no pescoço de um regador de jardim. Eu pertenço a um clube onde se pratica aviação esportiva. A tecnologia revolucionou de tal maneira todas as aeronaves de nossa frota que hoje temos aviões avançados, já não merecem mais ser chamados de ultraleves. Hoje em dia, os nossos aviões são muito mais velozes, têm mais potência, é outra aviação. Agora, a paixão é a mesma, o idealismo é o mesmo.
Qual o diferencial do “Bate Papo com Armando Nogueira” e os outros programas esportivos? 
Em primeiro lugar, meu programa tem uma preocupação de privilegiar o lado ético e poético do esporte. Essa é mais ou menos uma regra de ouro da concepção do meu programa. Depois, tento valorizar muito a palavra. Há uma doutrina em torno da televisão, que a TV vive da imagem, mas ela não vive só da imagem, o veículo é audiovisual. Se a imagem mostra, a palavra esclarece. Então a palavra tem um papel muito importante na televisão.
Após mais de 50 anos de carreira, qual a manchete que o senhor gostaria de escrever?
Eu gostaria de dar aos meus leitores a seguinte notícia: Garrincha acaba de ressuscitar.