por humberto peron
Nenhum jornalista esportivo escreve um texto como Armando Nogueira. Ao mesmo tempo em que é capaz de fazer poesia ao destacar o romantismo e a beleza do esporte, ele consegue compor textos acessíveis aos seus leitores. “Quando me perguntam qual é o meu melhor texto, eu digo que é o próximo. Porque a gente nunca está satisfeito com o que escreve”, afirma humildemente.
Além da excelência de seus artigos, Armando, aos 76 anos, é um sinônimo de credibilidade. O garoto que chegou ao Rio de Janeiro, em 1944, vindo da pequena Xapuri, no Acre, com o sonho de ser aviador, logo se apaixonou pelo futebol. Formado em Direito, começou a carreira no “Diário Carioca“, seis anos depois. No seu extenso currículo, há passagens pelo “Diário da Noite“, “Tribuna da Imprensa“, “Jornal do Brasil”, “TV Rio“, revistas “O Cruzeiro” e “Manchete“. Isso sem falar da marca de ter estado presente cobrindo todas as Copas do Mundo desde 1950.
Porém, o principal marco de sua trajetória foi quando exerceu a função de diretor de jornalismo da Rede Globo por 24 anos. Atualmente, ele escreve uma coluna esportiva em 60 jornais do Brasil, comanda o programa “Papo com Armando Nogueira” , no Sportv, e participa como comentarista dos principais eventos transmitidos pelo canal.
Prestes a lançar seu décimo livro, “A Ginga e o Jogo“, Armando concedeu esta entrevista na qual fala de sua relação com o esporte e a palavra, sobre o momento atual do futebol, dá sua opinião sobre os Jogos Pan-Americanos e revela qual manchete gostaria de dar um dia.
O senhor nasceu em Xapuri. O que o fez sair do norte do País para chegar ao Rio de Janeiro?
Eu cheguei ao Rio de Janeiro em 1944 com um projeto de vida que não tinha nada a ver com o jornalismo. Embora eu tivesse trabalhado como revisor lá no Acre, o meu plano de vida era ser aviador. Era meu ideal, que acabou frustrado por várias razões. Então, eu fui fazer o curso de direito. Mas já no segundo ano, fui atraído pelo jornalismo. Entrei num jornal chamado “Diário Carioca”, um diário de elite. Naquela época, o Rio de Janeiro era uma cidade fascinante, não tinha narcotráfico nem corrupção. Também não tinha especulação imobiliária. Era uma cidade maravilhosa. Era a coisa mais fácil chegar ao Rio de Janeiro e não sair mais daqui. Eu sei de muitas pessoas que vieram ao Rio de Janeiro, no passado, para ficar alguns dias e ficaram décadas. Foi o que aconteceu comigo.
O senhor nasceu em Xapuri. O que o fez sair do norte do País para chegar ao Rio de Janeiro?
Eu cheguei ao Rio de Janeiro em 1944 com um projeto de vida que não tinha nada a ver com o jornalismo. Embora eu tivesse trabalhado como revisor lá no Acre, o meu plano de vida era ser aviador. Era meu ideal, que acabou frustrado por várias razões. Então, eu fui fazer o curso de direito. Mas já no segundo ano, fui atraído pelo jornalismo. Entrei num jornal chamado “Diário Carioca”, um diário de elite. Naquela época, o Rio de Janeiro era uma cidade fascinante, não tinha narcotráfico nem corrupção. Também não tinha especulação imobiliária. Era uma cidade maravilhosa. Era a coisa mais fácil chegar ao Rio de Janeiro e não sair mais daqui. Eu sei de muitas pessoas que vieram ao Rio de Janeiro, no passado, para ficar alguns dias e ficaram décadas. Foi o que aconteceu comigo.
Qual o segredo para escrever um texto literário e popular ao mesmo tempo?
A chave da questão é o amor à palavra. Desde garoto eu tenho verdadeira veneração pela palavra. Comecei a ficar encantado pela palavra falada porque havia um poeta chamado Juvenal Antunes, que ficava declamando poemas nas ruas da minha cidade, e aquilo ressoava nos meus ouvidos como uma música. Então, aquela sonoridade, aquela musicalidade da palavra foi me cativando e desde cedo a gente aprende que o que entra pelos ouvidos vai direto ao coração. O fato de escrever um texto elaborado tem muito a ver com o exercício associado da imagem. Minha carreira sempre foi muito ligada à imagem. Minha sensibilidade ficou dividida entre a imagem e o texto. É como se eu fotografasse ou filmasse o fato que estou narrando. Quando me perguntam qual é o meu melhor texto, eu digo que é próximo, porque a gente nunca está satisfeito com o que escreve. Na verdade, tem sempre o que melhorar num texto.
A chave da questão é o amor à palavra. Desde garoto eu tenho verdadeira veneração pela palavra. Comecei a ficar encantado pela palavra falada porque havia um poeta chamado Juvenal Antunes, que ficava declamando poemas nas ruas da minha cidade, e aquilo ressoava nos meus ouvidos como uma música. Então, aquela sonoridade, aquela musicalidade da palavra foi me cativando e desde cedo a gente aprende que o que entra pelos ouvidos vai direto ao coração. O fato de escrever um texto elaborado tem muito a ver com o exercício associado da imagem. Minha carreira sempre foi muito ligada à imagem. Minha sensibilidade ficou dividida entre a imagem e o texto. É como se eu fotografasse ou filmasse o fato que estou narrando. Quando me perguntam qual é o meu melhor texto, eu digo que é próximo, porque a gente nunca está satisfeito com o que escreve. Na verdade, tem sempre o que melhorar num texto.
Ainda existe poesia no futebol?
Existe poesia em tudo. Numa pedra, num pôr-do-sol, num ombro de uma mulher. Há, no futebol, ou em qualquer outra modalidade esportiva, quando você se surpreende com a coincidência entre o momento estético que você está contemplando e sua própria alma. O ser humano busca a beleza e a perfeição, e o gesto esportivo tem muito a ver com a busca da perfeição da estética. Todo gesto esportivo tem esse sabor lúdico.
Existe poesia em tudo. Numa pedra, num pôr-do-sol, num ombro de uma mulher. Há, no futebol, ou em qualquer outra modalidade esportiva, quando você se surpreende com a coincidência entre o momento estético que você está contemplando e sua própria alma. O ser humano busca a beleza e a perfeição, e o gesto esportivo tem muito a ver com a busca da perfeição da estética. Todo gesto esportivo tem esse sabor lúdico.
Qual a sua opinião sobre a atuação da crônica esportiva no País?
O jornalismo no Brasil passou por diversos períodos de obscuridade. Atravessou vários períodos de ditadura e censura. Mas essa censura nunca chegou às páginas esportivas. Então o jornalismo esportivo é naturalmente um libertário. São poucos os jornalistas esportivos que têm espaço para opinar, a grande maioria dos jornalistas só informa. Você conta nos dedos os que têm esta prerrogativa de emitir opinião, de tentar contribuir pra moralizar e melhorar o futebol.
O jornalismo no Brasil passou por diversos períodos de obscuridade. Atravessou vários períodos de ditadura e censura. Mas essa censura nunca chegou às páginas esportivas. Então o jornalismo esportivo é naturalmente um libertário. São poucos os jornalistas esportivos que têm espaço para opinar, a grande maioria dos jornalistas só informa. Você conta nos dedos os que têm esta prerrogativa de emitir opinião, de tentar contribuir pra moralizar e melhorar o futebol.
Uma crítica ou elogio de jornalista pode influenciar a carreira de um jogador?
Eu acho que a crítica exerce um poder muito maior que nós imaginamos. Na verdade, a nossa opinião e julgamento sensibilizam 90% dos jogadores. Agora, esse peso não funciona para as raposas da política esportiva, elas ignoram a gente.
Eu acho que a crítica exerce um poder muito maior que nós imaginamos. Na verdade, a nossa opinião e julgamento sensibilizam 90% dos jogadores. Agora, esse peso não funciona para as raposas da política esportiva, elas ignoram a gente.
“Se o Pelé não tivesse nascido homem, teria nascido uma bola.” Essa é uma das suas mais famosas citações. Atualmente, existe algum jogador que poderia receber esse tipo de elogio?
Hoje há jogadores que realmente me encantam muito. O toque de bola do Zidane [Real Madrid], por exemplo. Me encanta muito a absoluta delicadeza com que ele faz um passe, toca na bola. Até parece que, comparada com a bola dele, a dos outros tem arestas. A dele não, é absolutamente redonda, parece que não tem costuras. Eu poderia citar o Romário [Fluminense], que é um jogador extraordinário, e oAlex [Cruzeiro]. Eles têm um toque de bola que é absolutamente mágico. Costumo dizer que há certos jogadores que têm a facilidade de tocar a bola de tal maneira que você não sabe onde termina o pé e onde começa a bola.
Hoje há jogadores que realmente me encantam muito. O toque de bola do Zidane [Real Madrid], por exemplo. Me encanta muito a absoluta delicadeza com que ele faz um passe, toca na bola. Até parece que, comparada com a bola dele, a dos outros tem arestas. A dele não, é absolutamente redonda, parece que não tem costuras. Eu poderia citar o Romário [Fluminense], que é um jogador extraordinário, e oAlex [Cruzeiro]. Eles têm um toque de bola que é absolutamente mágico. Costumo dizer que há certos jogadores que têm a facilidade de tocar a bola de tal maneira que você não sabe onde termina o pé e onde começa a bola.
O senhor nunca negou sua paixão pelo Botafogo…
Não, apaixonado não. Porque se você entra numa profissão como a minha, tem como regra sagrada a busca da eqüidistância e da imparcialidade. Isso é um princípio ético que o jornalista tem de respeitar. De tanto você ser cobrado eticamente ao ir para o computador, há uma cobrança muito grande da sua consciência. Não posso dizer que eu sou um apaixonado, diria que eu sou um apaixonado reprimido. O jornalista tem de ser um reprimido para conquistar credibilidade. Não acredito que, se eu fosse um escrachado torcedor do Botafogo, tivesse o número leitores que tenho, sobretudo merecesse o respeito deles.
Não, apaixonado não. Porque se você entra numa profissão como a minha, tem como regra sagrada a busca da eqüidistância e da imparcialidade. Isso é um princípio ético que o jornalista tem de respeitar. De tanto você ser cobrado eticamente ao ir para o computador, há uma cobrança muito grande da sua consciência. Não posso dizer que eu sou um apaixonado, diria que eu sou um apaixonado reprimido. O jornalista tem de ser um reprimido para conquistar credibilidade. Não acredito que, se eu fosse um escrachado torcedor do Botafogo, tivesse o número leitores que tenho, sobretudo merecesse o respeito deles.
Qual a diferença entre o futebol jogado atualmente e o do passado?
Ele não é nem melhor nem pior, é diferente. Mas continua muito interessante. O jogo teve uma fase de absoluta esterilidade por uns 30, 40 anos, quando predominava a retranca. Fiquei muito assustado quando vi agora a mídia brasileira exaltando o time do Boca Juniors, que derrotou o Santos na final da Libertadores. Aquele time não exprime o futebol argentino nem o futebol moderno. O futebol moderno é ofensivo. A quantidade de gols que acontece no futebol hoje, entre tempo regulamentar e prorrogação dada pelo árbitro, é infinitamente maior do que a gente pensa. Isso acontece porque os times estão jogando ofensivamente. Isso é inegável.
Ele não é nem melhor nem pior, é diferente. Mas continua muito interessante. O jogo teve uma fase de absoluta esterilidade por uns 30, 40 anos, quando predominava a retranca. Fiquei muito assustado quando vi agora a mídia brasileira exaltando o time do Boca Juniors, que derrotou o Santos na final da Libertadores. Aquele time não exprime o futebol argentino nem o futebol moderno. O futebol moderno é ofensivo. A quantidade de gols que acontece no futebol hoje, entre tempo regulamentar e prorrogação dada pelo árbitro, é infinitamente maior do que a gente pensa. Isso acontece porque os times estão jogando ofensivamente. Isso é inegável.

Foi o advento da televisão. Antes da TV eu tinha um olhar muito fechado, porque ia para o estádio ver futebol e não havia exposição de outros esportes. Aí, de repente, eu descobri encantos no tênis, no vôlei e no basquete. Antes, eu só ia a Copas do Mundo, e, de repente, comecei a ir a Jogos Olímpicos, o que também ampliou muito meu horizonte. Além disso, quando voltei a escrever em 1990, senti que precisava botar um olho na aldeia global e que eu não podia ficar só no futebol.
O que o público pode esperar da delegação brasileira nos jogos Pan-Americanos?
Eu acho que é sempre bom uma competição. Só que essas no nível pan-americano são absolutamente ilusórias. No último Pan, o Brasil trouxe 101 medalhas e deu a impressão de que nós éramos uma potência olímpica emergente. Na verdade, a gente tinha ganho medalhas folheadas a ouro, o que é diferente. Medalhas de ouro são nas Olimpíadas mesmo. Eu espero que os jogos de Santo Domingo não provoquem a mesma sensação ilusória que nos provocou o Pan de Winnipeg em 1999.
Eu acho que é sempre bom uma competição. Só que essas no nível pan-americano são absolutamente ilusórias. No último Pan, o Brasil trouxe 101 medalhas e deu a impressão de que nós éramos uma potência olímpica emergente. Na verdade, a gente tinha ganho medalhas folheadas a ouro, o que é diferente. Medalhas de ouro são nas Olimpíadas mesmo. Eu espero que os jogos de Santo Domingo não provoquem a mesma sensação ilusória que nos provocou o Pan de Winnipeg em 1999.
Seria possível apontar algum esporte ou atleta que deve ser destaque no Pan?
Nos esportes coletivos, para variar. O Brasil sempre terá chance no vôlei, basquete e futebol. São esportes nos quais a gente sempre se dá bem. Nos individuais, temos algumas esperanças, como a Maurren Maggi [salto em distância].
Nos esportes coletivos, para variar. O Brasil sempre terá chance no vôlei, basquete e futebol. São esportes nos quais a gente sempre se dá bem. Nos individuais, temos algumas esperanças, como a Maurren Maggi [salto em distância].
O senhor está lançando mais um livro. Sobre o que se trata?
O nome é “A Ginga e o Jogo” [Editora Objetiva]. É uma obra predominantemente de crônicas esportivas, mas tem também crônicas e perfis sobre pessoas não necessariamente ligadas ao esporte.
O nome é “A Ginga e o Jogo” [Editora Objetiva]. É uma obra predominantemente de crônicas esportivas, mas tem também crônicas e perfis sobre pessoas não necessariamente ligadas ao esporte.
No início da entrevista, o senhor falou sobre sua paixão pela aviação. Como ela surgiu? E suas atividades no clube de ultraleves?
Essa paixão é anterior à do esporte. É muito mais antiga, uma paixão primordial dentro da minha vida. Com cinco, seis anos de idade eu já sonhava que estava voando montado no pescoço de um regador de jardim. Eu pertenço a um clube onde se pratica aviação esportiva. A tecnologia revolucionou de tal maneira todas as aeronaves de nossa frota que hoje temos aviões avançados, já não merecem mais ser chamados de ultraleves. Hoje em dia, os nossos aviões são muito mais velozes, têm mais potência, é outra aviação. Agora, a paixão é a mesma, o idealismo é o mesmo.
Essa paixão é anterior à do esporte. É muito mais antiga, uma paixão primordial dentro da minha vida. Com cinco, seis anos de idade eu já sonhava que estava voando montado no pescoço de um regador de jardim. Eu pertenço a um clube onde se pratica aviação esportiva. A tecnologia revolucionou de tal maneira todas as aeronaves de nossa frota que hoje temos aviões avançados, já não merecem mais ser chamados de ultraleves. Hoje em dia, os nossos aviões são muito mais velozes, têm mais potência, é outra aviação. Agora, a paixão é a mesma, o idealismo é o mesmo.
Qual o diferencial do “Bate Papo com Armando Nogueira” e os outros programas esportivos?
Em primeiro lugar, meu programa tem uma preocupação de privilegiar o lado ético e poético do esporte. Essa é mais ou menos uma regra de ouro da concepção do meu programa. Depois, tento valorizar muito a palavra. Há uma doutrina em torno da televisão, que a TV vive da imagem, mas ela não vive só da imagem, o veículo é audiovisual. Se a imagem mostra, a palavra esclarece. Então a palavra tem um papel muito importante na televisão.
Em primeiro lugar, meu programa tem uma preocupação de privilegiar o lado ético e poético do esporte. Essa é mais ou menos uma regra de ouro da concepção do meu programa. Depois, tento valorizar muito a palavra. Há uma doutrina em torno da televisão, que a TV vive da imagem, mas ela não vive só da imagem, o veículo é audiovisual. Se a imagem mostra, a palavra esclarece. Então a palavra tem um papel muito importante na televisão.
Após mais de 50 anos de carreira, qual a manchete que o senhor gostaria de escrever?
Eu gostaria de dar aos meus leitores a seguinte notícia: Garrincha acaba de ressuscitar.
Eu gostaria de dar aos meus leitores a seguinte notícia: Garrincha acaba de ressuscitar.
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