quarta-feira, setembro 23, 2009

O governo Collor e João-Bafo-de-Onça

DO BLOG DO LUIS NASSIF:

Da coluna da Mônica Bérgamo:

“Mas, se ganha, não governa”, continuou Lula. “Outro dia, eu viajei com o Collor pra Alagoas. E eu perguntei pra ele: “Mas, Collor, como você foi nomear um cara como o João “Bafo de Onça” para o seu ministério [referindo-se a João Santana, nomeado por Collor secretário de Administração], um cara, sabe, que não ganhava nem eleição para diretório do PT?” E o Collor me disse: “Eu não tinha quadros”. É isso. Sem quadros, você não governa.”

Comentário do Luis Nassif:

Ainda está por merecer uma análise sóbria o governo Collor. O despreparo da equipe era evidente. O João “Bafo-de-onça”, mencionado por Lula, era o João Santana, primeiro indicado Secretário de Administração, depois Ministro da Infra-estrutura – um superministério que juntava quatro ou cinco ministérios de peso.

Na época, João era um meninão. Freqüentávamos o Bar Brasil, dos irmãos Caruso. Cada vez que arrumava uma namorada bonita, o João se comportava como um ser superior, que nem olhava para o lado, para gargalhada de uma turma de sacanas empedernidos, como o Percival Maricatto e outros.

Era um meninão, apenas isso, de idade e de cabeça. Seu cargo anterior mais relevante tinha sido o de uma espécie de guarda-costas do ex-Ministro Dilson Funaro.

Eleito presidente, Collor o indicou para a Secretaria da Administração. O estrago que ele fez levou anos para ser parcialmente corrigido. Conseguiu, inclusive, liquidar com o censo decenal do IBGE.

Na Infra-estrutura, Santana declarou certa vez à Gazeta Mercantil que caberia a ele definir o sistema de celular da Telesp. Fiz uma crítica duríssima a ele. Me chamou em Brasília, esticou um documento na minha frente e perguntou: “O que você acha agora desse modelo de licitação?”. Havia recuado da posição anterior e queria o aval de um jornalista para o novo modelo de licitação que estava preparando.

Não acreditei no que ouvia. Perguntei se ele estava brincando. Não, estava falando sério. Expliquei com toda calma que pude que não era advogado, não era especialista em licitação e não era avalista de ninguém. Se quisesse, divulgasse a minuta do edital e recolhesse as repercussões pela imprensa.

São dois episódios que mostram, por alto, a estrutura extremamente precária que Collor levou para seu governo. Sem contar sua Ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello, possivelmente a pessoa mais despreparada a ocupar esse cargo na história moderna do país.

Por outro lado, embora os métodos de Collor fossem conhecidos – e em nada fossem diferentes do que veio antes e depois -, antes do seu processo de demonização muitos políticos relevantes aceitaram os acenos feitos para que fossem compor a sua equipe.

No PSDB, por exemplo, Fernando Henrique Cardoso e José Serra quase aceitaram o convite. Foram impedidos por Mário Covas – na época, duramente criticado pelo então governador do Ceará, Ciro Gomes, por sua intransigência.

Não estou “acusando”FHC , Serra e Ciro de quase terem se tornado colloridos. Aliás, acho que o país teria ganhado muitíssimo se tivessem ido para o governo. Apenas mostro que houve dois Collors, o anterior ao período de demonização e o que foi demonizado pela imprensa e virou maldito.

Depois que ele caiu, nenhum dos quase aliados ousou sequer mostrar partes positivas de seu governo, por medo do patrulhamento. A mesma imprensa que o incensara, depois o amaldiçoara, jogando-o no limbo da história.

Aquela máxima das apelações na polêmica – invocar Hitler e o nazismo para liquidar a discussão – aplicou-se a Collor. Basta comparar um argumento ou situação com o Collor para liquidar com a discussão.

O tema Collor, aliás, mostra um dos pontos pobres da discussão pública. Não se pode analisar o personagem com seus defeitos e qualidades. A pobreza retórica faz com que se isole o elogio, o sujeito seja taxado de “pró-Collor” e estamos conversados.

E, assim, esse blogueiro, jornalista mais perseguido por Collor – tirou meu programa do ar em Brasília e no Rio, seu pessoal me processou várias vezes – teve que dar a cara a bater e defender isoladamente, nesses anos todos, que o governo Collor teve aspectos positivos e uma visão de futuro não igualada por seus sucessores, e só proporcional à sua falta de cintura política.

PS – Quem for patrulhar, devagar que hoje é o início da Primavera.

COMENTÁRIO MEU:

Cara-pintada que eu fui, tendo estado na rua pedindo o impedimento do presidente, devo dizer duas coisas, fica provado pela passagem do tempo, que não foi a corrupção quem tirou Collor do poder, haja visto os escândalos de maior gravidade, e sem punição alguma ou punições menores (meras maquiagens) que se seguiram na cena política nacional nos últimos 15 anos. Sendo a demonização que houve da figura do ex-presidente fato muito mais midiático do que jurídico.
A segunda coisa é que hoje, quando o Brasil alcança a terceira avaliação de grau de investimento (ou Investment Grade, para quem assim preferir), se formos olhar bem, quem lançou as bases para que o Brasil se modernizasse e aparecesse hoje como um player a ser levado a sério, foi exatamente o presidente Collor com as reformas que seu governo implementou.

Não me arrependo de nada que fiz naquela época, mas avaliando corretamente, Collor foi sim bom para a economia. Agiu mal no tratamento da coisa pública, e por isso mereceu o impedimento. Se fosse mantido o raciocíno tanto FHC, como Lula, repetiram a trajetória, tanto no que diz respeito a economia, tanto quanto no trato da coisa pública.


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